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É preciso criar uma cultura vocacional na comunidade

Agosto é o mês das vocações. A vocação de ser um sacerdote, religioso ou religiosa, de ser família, de ser leigo consagrado. No espírito da campanha Cada Comunidade Uma Nova Vocação conversamos com o padre Luan Adison Capelari, SAC, diretor espiritual na equipe de formadores do Teologado Palotino e promotor vocacional, sobre como podemos suscitar novas vocações.

Como trabalhar as vocações dentro da comunidade?

Acredito que a primeira coisa a ser feita é a oração. Vocação não nasce de outro lugar, senão da oração de toda a comunidade pelas vocações. Temos que rezar e rezar muito para que Deus envie operários para a messe, pois o trabalho é grande, mas poucos os operários. Segundo, precisamos criar uma cultura vocacional em nossas paróquias. Sem compreender que as vocações são prioridades apostólicas, dificilmente iremos suscitar vocações. Depois, claro, estar abertos, ouvir os jovens, seus anseios, ajudá-los a encontrar respostas; promover encontros de discernimento vocacional, mostrar a eles as formas de vida dentro da Igreja. Tem muito jovem que nunca procurou um seminário ou um convento simplesmente porque não sabe que pode, que pode conhecer, que pode conversar sobre isso. Ter esse contato com os padres, as Irmãs e os Irmãos é essencial.

Como “atrair” o jovem para a vocação sacerdotal ou religiosa diante de realidades que exigem que o jovem vá para o mercado de trabalho?

Eu não diria “atrair”, porque vocação não se atrai, mas sim se percebe, se descobre, se acolhe. O nosso trabalho (quando digo nosso é porque isso também é missão sua e de todo mundo) é o de ajudá-los a descobrir à vontade de Deus e o caminho que lhes trará verdadeira realização. Todos nascemos vocacionados. Primeiramente, claro, à santidade. Ser santos é nossa maior vocação. Encontrar nossa vocação específica dentro da Igreja é viver no caminho que Deus escolheu para nos santificar. Se você descobriu sua vocação, descobriu um tesouro, e nada te fará mais feliz que seguir esse caminho, trabalho nenhum, profissão nenhuma. É impossível ser plenamente feliz fora da vocação que Deus preparou para nós. Me lembro, inclusive, do que nos disse dom Júlio , em entrevista ao Programa Manhã com Maria, dos nossos fraters palotinos: “a vocação é mais do que profissão, aptidões, talentos. Vocação é chamado. E é Deus quem chama”.

Quais os desafios que os jovens vocacionados encontram pelo caminho até o sacerdócio?

Eu penso que a resposta para essa pergunta está na vida de cada um. Como cada um faz sua caminhada, cada um encontra seus próprios desafios, e o que é mais simples para alguns pode não acontecer da mesma forma para outros. Mas o que tenho notado com certa frequência no meu trabalho como promotor vocacional é a instabilidade emocional e espiritual e a dificuldade para firmar convicções, para se decidirem. Se torna cada vez mais desafiador tomar decisões que comprometam para a vida. Às vezes o contrário também acontece: alguns têm tanta pressa de ingressar em um seminário, não têm paciência de aproveitar do processo de acompanhamento e acabam por “queimar etapas”, agindo precipitadamente. Hoje em dia, encontramos jovens cada vez mais frágeis em sua auto identificação e contato com o mundo. Outros querem uma experiência de Deus, mas esperam que o Anjo Gabriel venha lhes dizer qual é a sua vocação. Olha, com exceção da Virgem Maria, acho que ninguém mais teve esse privilégio (hahaha). A maioria de nós temos que aprender a reconhecer a vocação no simples cotidiano da vida.

Como eles podem lidar com a opinião dos amigos e da família?

Quando almejamos seguir nosso caminho vocacional tudo o que queremos é o apoio dos que estão ao nosso redor, não é mesmo? Mas, infelizmente, nem sempre é assim. Nossa! Uma coisa que me deixa profundamente perturbado é quando nos deparamos com a hostilidade familiar frente à vocação do jovem. Mesmo dentro de famílias notadamente católicas não é incomum encontrar aqueles pais que rejeitam completamente a possibilidade de seus filhos ingressarem na vida religiosa. Jovens que vivem essas condições, frequentemente passam por dilemas vocacionais profundos.

É necessário muito diálogo e acompanhamento para lidar com essas famílias e auxiliá-las a alcançar a clareza da dimensão vocacional. Acho que no fundo, essas famílias não souberam lidar com algum trauma vocacional no próprio passado e transferem isso para os filhos. Tem jovem que tem mais senso religioso que os próprios pais. Meu conselho para eles é muita paciência, compaixão e oração. Além de saberem lidar e se responsabilizarem pelas próprias escolhas, caso sejam maiores de idade.

Muitas vezes, se não é a família, é o ambiente paroquial que desfavorece o surgimento de novas vocações. É triste dizer isso, mas quando aí não se encontra, sobretudo a oração, o testemunho de vida dos pastores responsáveis e o incentivo vocacional, por mais que o jovem se sinta chamado, não será capaz de desenvolver ali sua vocação.

Como discernir sobre a verdadeira vocação?

Ahhhh essa perguntinha (risos). É sempre uma das primeiras que eu escuto. Costumo dizer que, na verdade, não existe nenhuma fórmula ou palavra mágica. Como eu já falei, muita oração (pessoal e comunitária), testemunho de vida, entrosamento com os seminários e conventos (conhecer os carismas, as formas de vida), fazer encontros vocacionais e procurar se imaginar dentro daquela vocação, se você se sentiria realizado e feliz. Isso tudo ajuda, são ferramentas excelentes. Mas no fim das contas é você quem tem que decidir se está disposto a correr o risco e tentar. Quer saber qual a sua vocação? Se pergunte onde você seria mais santo. Lá está sua resposta.

Quais os caminhos trilhados dentro do seminário?

Na verdade depende de cada congregação ou diocese. Mas, via de regra, a formação ordinária de um seminário é composta de oito a nove anos. No nosso caso, por exemplo, o candidato ingressa no Postulado (um ano de adaptação, entrosamento, formação humana, religiosa e os primeiros passos no carisma palotino). Depois temos o noviciado onde, no decorrer de um ano de recolhimento e menor contato com o exterior, o candidato é convidado a aprofundar sua espiritualidade pessoal e Palotina, conhecendo mais a fundo a congregação e a si mesmo. Nos próximos sete anos ele se dedica aos estudos acadêmicos de Filosofia e Teologia. No final, se assim for da Vontade Divina e o candidato responder bem a todo o processo, amadurecendo, superando-se e demonstrando firme convicção da vocação, dá-se os encaminhamentos para a Consagração Perpétua e Ordenação, caso o seminarista seja um candidato ao presbiterado.

Como foi a descoberta da sua vocação?

Deus se utilizou de tanta coisa para me chamar, mas com certeza o Anjo Gabriel não apareceu para mim (risos). Quando comecei a frequentar de verdade a Igreja, no período da minha adolescência, eu sentia algo muito forte me impulsionando a sempre me envolver mais com Deus. Assim arranjei um “papel vitalício” no teatro anual da Paixão de Cristo da catequese. Minha paróquia de origem é a Santo Antônio, em Cambé. Eu era Jesus (risos) e por muito tempo fiquei conhecido assim, o “Jesus da catequese”. Depois comecei a participar do grupo de adolescentes da paróquia e me tornei coroinha, participei da RCC e ajudei nas quermesses de Santo Antônio.

Por mais feliz que fosse minha vida com Deus, nada disso me completava de verdade, acredita? Em um determinado retiro que fiz (eu fiz muitos retiros na minha vida) partilhei essa aflição com o sacerdote na hora da confissão. Eu disse: “padre, eu acho que não faço o suficiente para Deus. Eu quero fazer mais, mas não sei como”. Lembra que eu disse que alguns jovens simplesmente nunca foram “provocados”, chamados a dialogar sobre vocação? Pois é, esse padre me provocou: “e você já pensou em ser padre?”.

Nunca mais encontrei aquele sacerdote, mas aquelas palavras caíram como relâmpago, e ficaram gravadas na minha mente. Não tive paz depois daquilo. Então fui procurar meu pároco, na época o Pe. Amaury, partilhei com minha família (nada fácil essa parte) e fiz o acompanhamento vocacional até ingressar no seminário.

Acho que minha vocação nasceu do simples, do dia a dia, do contato com as coisas de Deus e da Igreja. Gosto de usar o termo “da sede de Deus”, daí descobri minha vocação. Então, se me permite dizer mais uma coisinha, queria pedir aos jovens que não desistam de ser felizes ao lado de Deus, não percam a coragem, a valentia de dizer Sim aos planos de Deus. Abandonamos muitas coisas na vida por medo. O medo não vem de Deus. “Não tenhais medo”, Ele nos diz. A vocação acontece na vida, no cotidiano. E quando nos sentimos chamados por Deus, acredite, nosso coração não descansa enquanto não responder.

E não espere o Anjo Gabriel, viu. Você não é Nossa Senhora (risos), mas você é filho dela. Então se agarre a Ela, pede sua intercessão, que Ela te ensine a dizer Sim como Ela disse.

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